Violência contra professores gera preocupação
Colapso moral, familiar e social estão entre as causas do problema
O convívio entre professor e aluno, cada vez mais, precisa ser mediado pela polícia. Reprodução
“Quando crescer, quero ser professor”. Esta afirmação, que fez parte do passado, está cada vez menos presente nos dias atuais. A nobre missão de ensinar, com méritos indiscutíveis, fez do mestre uma referência, um exemplo de homem/mulher, tamanho o respeito e admiração retribuídos por alunos, pais de alunos e sociedade em geral.
Infelizmente esta relação se perdeu no tempo. O carinho e fascinação de antes se transformaram em uma relação de desrespeito e medo. Hoje o professor é vítima de ameaça, injúria e desacato dentro e fora da sala de aula a todo e qualquer instante. Esta violência tem causado o afastamento de muitos abnegados mestres de prosseguir no magistério. O que está acontecendo com os alunos? Eles são reflexo de um colapso moral, familiar e social? As medidas punitivas têm surtido o efeito necessário? Estas e outras perguntas foram feitas para dirigentes escolares, Conselho Tutelar e Ministério Público, guardião da infância e juventude.
VIOLÊNCIA CONTRA O PROFESSOR
A reportagem solicitou à Polícia Civil um levantamento sobre o número crescente de boletins de ocorrência feito por professores, dirigentes escolares e funcionários do setor. A delegada Denise Vichiato Polizelli autorizou a pesquisa que apontou que num período de 2 meses foram registradas 8 ocorrências desta natureza. Quatro na EE “Prof. Darcy Silveira Vaz” e outras 4 na EMEF “Lamounier de Andrade.
A delegada também manifestou apreensão com a situação. “Causa preocupação esta violência que tem como alvo os professores, que são profissionais encarregados da formação dos adolescentes dificultando todo o processo de aprendizagem na escola e dos alunos como cidadãos”.
DIÁLOGO E ENVOLVIMENTO DAS FAMÍLIAS SÃO O CAMINHO
A dirigente de Ensino da Região de Barretos, Solange de Oliveira Bellini, concedeu entrevista ao “O COLINENSE” e deixou claro que o diálogo é o principal caminho para o enfrentamento do problema, que também necessita da democratização das relações e o maior envolvimento das famílias.
A E E “Prof. Darcy Silveira Vaz, única escola estadual e de ensino médio do município, registrou 4 ocorrências contra professores. “Por essa razão a abrangência de conflitos se torna maior. Os professores estão trabalhando com alunos muito vulneráveis por conta da fragilidade da família. O diálogo é o caminho para a aproximação e o resgate deste adolescente enquanto está na escola . Hoje tem se requisitado do profissional docente essa capacidade de escutar e entender”, destacou Bellini.
A escola estadual trabalha atualmente com a política de redução de danos para alunos em situação de vulnerabilidade social. “Temos que entender os riscos que o aluno está exposto, promovendo o acolhimento para que se sinta protegido e respeite o espaço escolar. Ele também é chamado para se explicar e entender o que fez para conscientização do erro e a retratação com o professor, funcionário e ou colega. A escola tem um regimento interno com as normas de convivência que são cumpridas. Existe todo um trâmite a ser seguido, os pais são chamados e o aluno suspenso”.
Ela explicou também que a escola passa por um período de transformação e muitos professores deixam o magistério por não aceitarem essa realidade ou não se sentirem preparados para lidar com conflitos porque a formação não ensina isso. “Existe um trabalho nesse sentido para o professor não entrar no confronto e requisitar a ajuda do professor mediador ou gestor”.
Ela apontou como uma das soluções para o problema a implantação do EJA – Educação de Jovens e Adultos no município, que atende alunos que estão fora do limite de idade de escolarização, a partir de 18 anos, no período noturno. “Trazer o EJA é uma medida para corrigir a distorção e preservar os alunos menores. A conclusão do ensino regular acontece em 3 anos e no EJA esse período diminui pela metade”.
Para a dirigente o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), criado há quase 27 anos, garante os direitos através de medidas protetivas, mas cabe a sociedade praticar e assumir as penalidades punitivas. “As medidas socioeducativas têm que ser amplamente aplicadas na sociedade porque todos os problemas acabam desembocando na escola. O aluno precisa enxergar que está fazendo o mal para o outro”.
MUDANÇA DE POSTURA PARA SOLUÇÃO DE CONFLITOS
A EE “Prof. Darcy Silveira Vaz”, onde foram registradas quatro ocorrências, também foi procurada pela reportagem. A diretora substituta, Ana Maria Piai, esclareceu que, “o aumento do registro de ocorrências de ameaças, desacato e injúria contra professores e funcionários apenas reflete a atitude expressa por estes jovens estudantes nos demais espaços sociais com pessoas de seus convívios”. Acrescentou, “a escola, os professores, a direção e mediação realizam um trabalho intenso de orientação para um convívio mais pacífico e harmonioso (de maneira mais específica pelo professor mediador)”.
Ela explicou também que “muitos casos de situações extremas acabam permitindo um trabalho satisfatório dentro da escola com a retratação dos envolvidos e até mesmo de expressa solução de conflitos que se originaram fora do espaço escolar, já sendo inclusive do conhecimento dos familiares e amigos”.
Quando ocorrem casos de violência a escola realiza o registro em livro próprio. “É feito o efetivo acompanhamento com diálogo, orientação e reflexão visando uma consciente mudança de postura. Caso isso não ocorra e o aluno insista na atitude são encaminhados os registros de boletim de ocorrência policial para responsabilizar, de forma mais consciente, os jovens e os pais ou responsáveis”, ressaltou a diretora.
A diretora ainda destacou que diante dos conflitos deve-se praticar o que Rubem Alves ensina: “Educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo”.
ATUAÇÃO DO CONSELHO TUTELAR É LIMITADA PELA IDADE
O Conselho Tutelar também é acionado quando os fatos ocorridos no ambiente escolar envolvem alunos com até 12 anos de idade incompletos. Estes casos são de competência e atribuição do órgão, que tem função protetiva e não punitiva. Fora deste limite de idade quem deve ser acionada é a Polícia Militar.
“Esgotados todos os recursos e não tendo mais onde recorrer é preciso registrar o boletim de ocorrência, caracterizando a prática de ato infracional que será encaminhado ao Ministério Público para aplicação das medidas socioeducativas, exceto para alunos de até 12 anos incompletos. Nesses casos cabe ao Conselho Tutelar aplicar as medidas de proteção”, explicaram os conselheiros.
Desde meados de março o Conselho Tutelar implantou nas escolas do município o Projeto “Conselho Tutelar Amigo da Escola” que visa auxiliar as instituições de ensino a amenizar e solucionar os principais conflitos entre crianças e adolescentes no ambiente escolar.
Para alguns especialistas no assunto, comparar o ambiente escolar com o de antigamente também não é o caminho para o enfrentamento do problema porque a realidade vivida atualmente é bem diferente de tempos atrás, quando havia mais deveres que direitos e a tecnologia não estava tão avançada.
Diante de tudo isso a pergunta persiste: O que fazer para combater a violência contra os professores?
Até o fechamento desta edição, na terça-feira, a responsável pela Escola Lamounier, que está respondendo pela direção no lugar da titular, não se pronunciou a respeito.
A delegada de polícia, Denise Polizelli, mostrou-se preocupada com a violência contra professores.
“Os professores estão trabalhando com alunos muito vulneráveis por conta da fragilidade da família”, destacou a dirigente regional de Ensino, Solange Bellini, que defende o diálogo para resgatar e acolher o aluno.
“O êxito de qualquer ação socioeducativa está condicionado ao ambiente familiar”
O promotor de Justiça, Matheus Faim Botelho (foto), disse que o Ministério Público é comunicado nos casos registrados de desacato, ameaça e injúria praticados por alunos contra professores e funcionários das instituições de ensino.
“O crescimento da violência, em qualquer de suas formas ou em diferentes ambientes, sempre é fator de preocupação por toda a sociedade. Porém, quando envolve crianças e adolescentes enquanto pessoas em condição de desenvolvimento, causa maior preocupação em decorrência das consequências trágicas para o futuro da nossa comunidade, vez que, certamente, tais práticas infracionais refletem na formação do caráter e conduta social do adulto de amanhã”, destacou.
Ele também explicou sobre as medidas adotadas para coibir esta situação. “Diariamente, pela Promotoria de Justiça são aplicadas diversas medidas socioeducativas em decorrência da prática de atos infracionais por adolescentes, podendo chegar, nos casos mais graves ou de reincidência na prática de atos infracionais, até mesmo à internação na Fundação Casa. Porém, do mesmo modo há trabalho preventivo desenvolvido não apenas pela Promotoria de Justiça, mas por toda a rede de atendimento, através da aplicação de medidas de proteção, a fim de prevenir a ocorrência de situações de risco e a prática de atos infracionais”.
Para o promotor o ambiente familiar é fundamental para se obter resultados positivos. “A adoção das diversas medidas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente possuem eficácia, porém é importante observar que o êxito de qualquer ação está condicionado ao ambiente familiar vivenciado pelo infante. A título de exemplo, temos o processo de escolarização aqui tratado. Sem dúvidas, a escola é uma fase importantíssima na formação da pessoa em condição de desenvolvimento, porém não substitui a responsabilidade da família em educar, que se trata de conceito muito mais amplo. Vale dizer, de muito pouco adianta o tempo e dinheiro estatais despendidos em qualquer área da infância se, ao mesmo tempo, as crianças e adolescentes não vivenciarem um ambiente familiar com regras e valores positivos”.
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