Pare por um instante. Feche os olhos, ou apenas desvie o olhar da tela. Sinta. O ar nos pulmões. O sutil pulsar do sangue. Os ecos do mundo lá fora. Dentro de você, neste exato momento, acontece o evento mais extraordinário e, paradoxalmente, mais comum do universo conhecido: a sua consciência. Essa luz acesa. Esse simples – e insondável – estar aqui.
Essa chama interior é o nosso elo mais fundamental. Ela arde no cientista que calcula a órbita de galáxias distantes e na criança que se maravilha com a formiga no chão. Ela ilumina a mente capaz de compor sinfonias complexas e aquela que luta para formar palavras simples. Medimos QIs, classificamos habilidades, traçamos linhas na areia – 120 aqui, 55 ali. Mas por baixo de cada rótulo, pulsa a mesma verdade nua: a presença. O fato bruto de haver experiência. Como pode essa faísca primordial, tão universal, pintar universos interiores tão singularmente vastos e diferentes?
A resposta, suspeitamos, não mora apenas nos circuitos e sinapses que a ciência tão brilhantemente mapeia. Sim, um cérebro mais eficiente pode processar informações com mais velocidade ou abstração – essa é a face mensurável, a inteligência que testamos. Mas a verdadeira diferença, a nuance que nos escapa, talvez resida na qualidade dessa chama, na textura da experiência que ela ilumina.
Pense no vermelho. Seu cérebro registra um comprimento de onda, ativa áreas visuais. Mas o vermelho que floresce em sua mente – a sensação vívida, talvez associada ao calor, ao perigo, a uma lembrança de infância – é só seu. Ou o medo. Sabemos do papel crucial da amígdala, o alarme do cérebro. Mas o arrepio gelado na espinha, o nó na garganta, o sentir do pavor… isso transcende a biologia molecular. É o quale, a qualidade subjetiva irredutível, a matéria-prima do seu universo privado.
E que universo! Talvez sua mente consciente não seja apenas um palco, mas um cosmos em si. Onde pensamentos irrompem como supernovas, emoções tingem nebulosas inteiras de alegria ou melancolia, e memórias traçam constelações de significado. Talvez, como sussurram alguns pensadores, essa paisagem interior possua uma beleza fractal: cada instante, cada sensação, ao ser contemplada, revela camadas e mais camadas de detalhes, um padrão infinito de complexidade auto-similar. A inteligência é apenas uma das ferramentas para navegar esse território; ele contém também os abismos da dor, os picos do êxtase, a vastidão do amor e a quietude do silêncio profundo.
A ciência, nossa valente exploradora do real, avança mapeando as costas desse continente interior. Ela nos mostra as conexões, os mecanismos, os correlatos neurais. Mas o coração desse território – a experiência subjetiva em si – permanece envolto em mistério. E talvez seja bom que seja assim. Pois é nessa fronteira, onde o mapa termina e a experiência começa, que reside a nossa humanidade mais profunda. É o espaço onde a filosofia ousa fazer as perguntas eternas, não apenas sobre o como, mas sobre o quê e o porquê de sermos quem somos.
Então, na próxima vez que você se encontrar imerso no fluxo da vida – seja resolvendo um problema complexo ou simplesmente sentindo a chuva no rosto – permita-se um momento de assombro. Reconheça a chama extraordinária que arde dentro de você. Essa consciência não é apenas um processo biológico; é a tela onde toda a sua existência se desenrola, o bem mais íntimo e precioso que você possui. Explore suas profundezas, honre sua complexidade. Pois é nesse espaço sagrado e pessoal, vibrando no centro do seu ser, que reside o milagre estonteante de estar vivo e ciente. E isso, por si só, é motivo para sentir uma profunda e vibrante emoção.

Dr. José Reynaldo W. de Almeida
Neurocirurgia e Neurologia
CRM: 28475 | RQE: 20057 / 20159


