Dr. José Reynaldo Walther de Almeida CRM 28475 SP
RQE 20057 RQE 20159

Você já se perguntou como seria viver sem aquela sensação de pertencer a um time, uma nação, ou até mesmo um grupo de amigos que pensam igual? Pois um psiquiatra, Ramil Kaminski, contou no NewScientist algo que pode mudar como vemos a mente humana: para muitas pessoas — ele incluso —, essa falta de identificação com “tribos” não é um transtorno, mas uma forma legítima de existir. Ele deu um nome a isso: “otrovert”. Vou me abster de traduzir por razões claras; não sei.
Imagine assim: desde que nascemos, o mundo nos apresenta etiquetas. Somos “filhos de X”, “torcedores de Y”, “membros de Z”. Para a maioria, essas identidades coletivas são como portos seguros. Mas para os otroverts? São como roupas que nunca servem direito. Não é que eles sejam frios ou isolados — na verdade, muitos têm relações profundas e afetuosas. A diferença é que seu cérebro não precisa de grupos para definir quem são. Eles simplesmente, são.
A neurociência nos lembra que cada cérebro é um universo único. Enquanto alguns encontram conforto no “nós”, os otroverts brilham no “eu”. E, não são egoístas. Eles não rejeitam os outros — só não sentem aquela ânsia de fundir sua identidade com algo maior. É como se seu cérebro dissesse: “Minha história já é completa por si só”.
Por muito tempo, essa característica foi vista como problema. “Falta de lealdade”, “dificuldade de conexão” — rótulos que causaram sofrimento desnecessário. Mas forçar um otrovert a fingir lealdades tribais é como exigir que um pássaro viva debaixo d’água. Não só é injusto, como ignora seus dons únicos: a capacidade de enxergar além das divisões, de mediar conflitos sem viés, de criar sem se prender a dogmas. São mentes que inovam justamente porque não seguem manadas.
Se você se reconhece nessa descrição, respire fundo: seu cérebro não está quebrado. Ele opera num modo diferente — e isso é uma forma de riqueza neural. Talvez você já tenha se sentido deslocado em festas cheias de “torcedores apaixonados”, ou perplexo com discussões acaloradas sobre política. Saiba que sua perspectiva é válida. Você não é isolado: é inteiro por natureza.
E se você convive com um otrovert, entenda: quando ele não vibra com o mesmo time ou causa que você, não é desamor. É apenas uma arquitetura cerebral que encontra verdade não no coletivo, mas na autenticidade. Isso pode ser um presente! Num mundo tão dividido, quem tem um pé (e um cérebro) fora das trincheiras tribais muitas vezes enxerga soluções que outros perdem.
No fim das contas, a história dos otroverts nos ensina algo lindo: a mente humana não vem em modelo único. Cérebros podem ser sociais de muitos jeitos — alguns pela fusão, outros pela liberdade. E talvez, justamente agora, quando o mundo parece fragmentado por identidades que se enfrentam, esses “desafiliados” tenham algo crucial a nos oferecer: a lembrança de que, antes de qualquer bandeira, somos todos humanos. Capazes de nos conectar não pelo que nos separa em grupos, mas pelo que nos une como pessoas.
